Conversei com (A) cartunista e ativista Laerte Coutinho em 2014 para um projeto de entrevistas com pessoas influentes que a Elemdia (empresa de Out Of Home, ou conhecida como `telinhas de elevador') estava começando, chamado de `SpeedReading`.
De lá para cá muita coisa mudou, algumas perguntas refletem aquele período, outras tenho certeza que para a cartunista são atemporais. O cenário político não é o mesmo , teve Copa do Mundo e a gente perdeu em todos os sentidos, assim como na Olimpíada e Paraolimpíada também. E gastos, muitos gastos. Obras superfaturadas, estádios sem uso, Estado declarando falência e aquilo tudo que já sabíamos, infelizmente .
Escolhi a Laerte como personagem porque tinha curiosidade sobre o travestimento dela, que anos se identificava como ele. Houve um fato que chamou atenção também, a questão do banheiro de gênero. Em 2012, dois anos depois de se assumir como transexual, Laerte foi vitima desse `bigenerismo` quando tentou usar o sanitário feminino em um estabelecimento de São Paulo .
A entrevista foi realizada em abril daquele ano, ela foi no prédio onde ficava a Elemidia com uma regatinha azul, cor que faz parte do Dia Mundial da Conscientização do Autismo, data da nossa conversa. Eu estava receosa em cometer alguma gafe no meu tratamento, mas na primeira olhada entendi que nem precisava me preocupar. Laerte estava de saia jeans, maquiagem e unhas pintadas. Elegante, Laerte se apresentou. Na primeira olhada eu já tinha percebido que Laerte não era mais O, Laerte era A.
De lá para cá muita coisa mudou, algumas perguntas refletem aquele período, outras tenho certeza que para a cartunista são atemporais. O cenário político não é o mesmo , teve Copa do Mundo e a gente perdeu em todos os sentidos, assim como na Olimpíada e Paraolimpíada também. E gastos, muitos gastos. Obras superfaturadas, estádios sem uso, Estado declarando falência e aquilo tudo que já sabíamos, infelizmente .
Escolhi a Laerte como personagem porque tinha curiosidade sobre o travestimento dela, que anos se identificava como ele. Houve um fato que chamou atenção também, a questão do banheiro de gênero. Em 2012, dois anos depois de se assumir como transexual, Laerte foi vitima desse `bigenerismo` quando tentou usar o sanitário feminino em um estabelecimento de São Paulo .
A entrevista foi realizada em abril daquele ano, ela foi no prédio onde ficava a Elemidia com uma regatinha azul, cor que faz parte do Dia Mundial da Conscientização do Autismo, data da nossa conversa. Eu estava receosa em cometer alguma gafe no meu tratamento, mas na primeira olhada entendi que nem precisava me preocupar. Laerte estava de saia jeans, maquiagem e unhas pintadas. Elegante, Laerte se apresentou. Na primeira olhada eu já tinha percebido que Laerte não era mais O, Laerte era A.
Você disse em entrevista (Folha) que o termo
crossdressing serviu para te ajudar a se assumir, mas que mais tarde você
percebeu que esse termo te diferenciava da classe dos travestis, Qual a
diferença?
Crossdresser é um termo que vem dos EUA e
servia para caracterizar, principalmente, homens que usavam essa linguagem de
travestimento para expressar sua transgeneridade. Era uma maneira de deixarem
notória sua heterossexualidade. Como orientação sexual e identidade de
gênero são coisas independentes, embora se flexione, lógico, esse grupo
americano queria deixar claro essa diferença, inclusive existem grupos que
proíbem a entrada de homos. Quando esse termo veio para o Brasil, ele serviu
mais para uma distinção social, porque a travesti é uma pessoa transgênera
pública muito marcada como alguém no mercado da prostituição, então as pessoas
de classe média que quiseram se expressar preferiram adotar esse termo
para manter certa distância. É uma distinção preconceituosa, baseada num
preconceito social do Brasil. Dentro do grupo das crossdressing existem todas
as orientações sexuais, assim como em qualquer lugar.
Como você se define agora: crossdressing, travesti
ou mulher?
Eu me defino cada vez menos (risos).
Quanto mais a gente faz questão dessas coordenadas mais distantes ficamos da
realidade. Eu me acho uma mulher trans e uma mulher trans é uma pessoa que se
sente mulher, mesmo tendo um pau. É uma pessoa que se entende mulher e
ocupa socialmente o lugar de uma mulher dentro dos parâmetros que nossa cultura
oferece.
Quem veio primeiro: o Hugo que se travestiu
ou a Laerte que virou mulher? Quem inspirou o que?
Ao contrário do ovo e da galinha (risos),
quem veio primeiro foi o Hugo.
Laerte em 120 caracteres ou em uma frase?
Sou péssima nessas sínteses, eu dou muita
volta. Nenhuma das coisas que formulo me parece sintética. Mas às vezes eu
chego a sínteses muito boas, até pelo meu trabalho de cartunista que favorece a
construção de linguagens objetivas e acaba exigindo isso.
Tipo sua última charge, que uniu dois assuntos que
estão em alta?
Exatamente. Esse tipo de coisa eu jamais
conseguia formular (risos). Me surpreendi também (risos)
Quanto tempo demora para criar uma tirinha?
Depende muito. Tem muitas variáveis,
fazer desenho em si não é tão demorado. Mas nunca é só o desenho, é o que
veio antes do desenho. Tudo faz parte, desde estudos com livros até os porres
que tomei na vida (risos).
Por que demorou tanto para se assumir e em que
momento você percebeu que já estava na hora?
Eu penso muito sobre isso e acho que eu
poderia até ter continuado minha vidinha sem ter tido essa percepção, e se não
tivesse quase por acaso aberto essa porta, que na verdade foi aberta por outras
pessoas, eu provavelmente estaria levando a vida que levava, mas muito
mais infeliz. Se existe alguma coisa que passou dentro de mim e é evidente é um
estado de satisfação enorme e isso não acontece assim por mágica ou por
voluntarismo nem por nada, é quando você pega na veia mesmo. Eu já sabia que
tinha componentes na minha sexualidade claramente homossexuais, nunca
tinha chegado à expressão de gênero e ao fazer isso me vi fazendo uma
descoberta. Era isso que eu queria fazer. Antes eu estava em uma vivência frustrada,
obscura e clandestina, até para mim (risos).
Sexualidade, como assim?
Eu comecei minha vida sexual com homens e
teve um momento que eu entrei em pânico com essa ideia. Coloquei tudo dentro do
armário e passei a viver como heterossexual na boa. Casei três vezes, tive filhos e
segui a vida.
Por que demorou tanto tempo para sair do armário?
Teve medo de preconceito?
Sim, eu tinha medo de preconceito.
A ideia poderosa de que a vivência da homossexualidade era um desvio,
algo visto como anormal fez com que eu me escondesse.
Você passou por algum tipo de “opressão”, mesmo que
sem querer na sua infância e adolescência?
Provavelmente teve. Eu era da geração dos
Beatles e tinha aquela moda de ser cabeludo, eu queria deixar meu cabelo
crescer e durante um tempo foi vetado isso para mim. Eu nunca fui um
adolescente rebelde, sempre obedecia e me submetia. Minha família era bem
liberal, mas tínhamos muito claro o que era ser homem e mulher e que essas
coisas não podiam se cruzar.
Como você define esse estado de felicidade?
Um encontro de alguma coisa que eu nem
sabia que estava procurando. Acho que tem várias loucuras que fazemos na
vida e que não temos muito claro o motivo. Muitas vezes é o encontro de algo
que está procurando que te trás à evidência. O que aconteceu comigo foi o
oposto do que acontece com a maioria das trans que conheço.
Reparei que você faz unha e depilação?
A manicure faz minhas unhas. Depilação eu
mesma faço atualmente, se eu não estiver com algum problema na coluna (risos).
Mas é bem mais confortável fazer com outra pessoa. Eu fiz depilação a lazer
para tirar os fios pretos da cara, mas tenho que fazer a barba todo dia.
Acompanha tendência da moda?
Eu dificilmente sigo moda
Pegou alguma mania de sua mãe para se vestir?
Sim, inclusive roupas dela. Minha mãe se
maquia muito pouco, eu raramente a via produzida. Para se ter uma ideia, ela só
furou a orelha adulta e madura por causa de uma namorada minha que tinha uns
brincos legais. Minha mãe considera o modo masculino bem prático e ela viveu um
pouco isso. Eu acho encantador esse mundo cosmético e não vejo sentido em distinguir
o prático do feminino. Eu estou construindo o caminho próprio dentro de
uma trilha reconhecidamente feminina.
Você tinha algum preconceito ou pensamento machista
que foi quebrado quando você se assumiu?
Bastante, mas não exatamente por causa
desse movimento. Já tive bastantes pensamentos e ações machistas e homofóbicas
no decorrer da minha vida. Eu vim fazendo críticas e correções dessas coisas. O
fato estar frequentando a área cultural feminina não me fez mudar muito o jeito
que pensava e não me trouxe tanto a mais do que eu já tinha. Quando houve
aquela questão do banheiro, eu fiquei pensando nisso, como diz a Beatriz B: “o
banheiro é uma área de produção de gênero, não é um território livre de
segurança para as mulheres”. O que está se produzindo com isso é o bigenerismo.
Mas você não acha que as separações de banheiro são
feitas para evitar certos casos de assédio?
O assédio é resultado desse bigenerismo.
O machismo e muitas outras coisas estão conectados a essa lógica da opressão.
Essa opressão se dá porque está se concebendo a humanidade em blocos
diferentes, onde um manda no outro. Essa concepção machista é a mesma da
homofobia e a do estupro, é o que orienta todos esses tipos de barbaridades que
vemos contra mulher e o ser-humano. Os homens deveriam todos se indignar
com a quantidade de estupros que acontecem ao invés de se preocuparem com
certas questões de moral. Cada mulher violentada, cada gay e trans atacados é
ataque à civilização e a nossa cultura.
No começo você se travestia como ato político para
ser aceito mais rápido?
Não. Eu me vestia para eu mesma. No
começo usava roupas mais modestas, como uma senhorinha (risos). Era medo, eu comecei
com uma timidez grande. Uma senhora tímida mesmo, cheia de dúvidas sobre minha
idade, sobre usar saia curta etc. Aos poucos fui descobrindo algumas
possibilidades e como fazer algumas audácias. Tudo isso em busca do clímax da
minha expressão.
Você sente falta de algum comportamento que tinha
como homem, como andar de perna aberta ou coçar o saco?
Não sinto. Eu nunca fui um grande coçador
de saco, eu já tive modos claramente masculinos como sentar de perna aberta.
Aliás, mulheres fazem isso também quando estão de calça. A experiência de se
vestir como mulher me tem colocado de frente a essas questões. Estando de saia
eu não sentaria de perna aberta, tem que ter um certo censo de conveniência. Eu
gosto de sair de sainha com as minhas perninhas depiladas, porque tem travesti
que não se depila. As pessoas estão aprendendo a ficar cada vez mais a vontade
dentro do cardápio das possibilidades de gêneros e eu acho isso ótimo, até o
ponto da agente não poder mais distinguir o que é homem e do que é mulher.
A Laerte de agora namoraria o Laerte do passado?
Não, jamais me pegaria (risos).
Você teve uma aceitação boa, mas se fosse com outro
tipo de personalidade, jogador de futebol, por exemplo, você acha que seria tão
respeitada?
Eu tive uma aceitação muito boa mesmo,
acho que ser artista me ajudou, mas ao mesmo tempo esta foi uma
circunstância que me impediu durante toda a vida de assumir minha sexualidade,
as porradas que não tomei quando assumi são reflexo do que passei. Não tem como
comparar, ainda mais em uma área esportiva que provoca outras discussões. As
federações em geral nem pensam nesse assunto, uma das poucas que tem essa
política é fora do Brasil. Cada área tem suas implicações, agora a torcida do
Corinthians tem uma torcida gay e isso mostra que as coisas estão acontecendo
para ter aceitação, o mundo não está parado e é legal isso.
Como surgiu a ideia de criar a ABRAT (Associação Brasileira de Transgêneras)?
É uma reunião de pessoas interessadas em
manter um padrão de discussão sobre transgeneridade fora do contexto dos
crossdressers. Queremos discutir políticas para esse grupo desde empregos, leis
etc. Nós estamos em momento de construção institucional.
Quais foram as conquistas de vocês até o momento?
Todos os dias temos uma conquista
(risos). Não são conquistas da ABRAT, são vitórias do movimento. Tem a
formulação da lei João Nery, projeto do Jean Willys, que propõe algo muito
próximo da leis argentinas, que é considerada mais avançada do mundo
quando se trata de legislação para trans. A Márcia Rocha, minha companheira de
ABRAT criou uma agência de empregos para trans. Estamos indo ao encontro
com empresas que têm interesse em dar abertura, governo que está interessado
que essa abertura exista e as trans que não conseguem e querem arrumar emprego.
Por que a classe das travestis é tão mal vista pela
sociedade?
Machismo. É considerado uma vergonha o
homem se relacionar com homem, um homem não ser um homem. Mas ao mesmo tempo é
irresistível porque as travesti são sempre procuradas.
A cirurgia de troca de sexo é segura?
Razoavelmente segura, mas nem todas as
travestis querem trocar de sexo. Hoje em dia todas as cirurgias são
feitas pelo SUS.
Você pretende fazer?
Não, mas tem muitas outras instâncias de
intervenções cirúrgicas que podem ser feitas. Eu vou colocar prótese nos
seios, é um processo razoavelmente seguro, mas estou adiando um pouco por causa
dos meus trabalhos. Tenho uma exposição em setembro.
A parte mais difícil de ser mulher?
Nenhuma. Eu adoro andar de salto por
exemplo. Acho que o mais difícil agora é deixar de ser mulher (risos) e
não quero fazer isso.
Como você se imagina daqui uns anos?
Pois é, eu já estou nesse daqui uns anos
(risos). Não sei dizer, a vida é um processo louco e eu nunca
consegui fazer previsões e nem planejamento de médio prazo. Eu estou
satisfeita com o que está acontecendo agora e com o rumo que as coisas estão. Não
quer dizer que esteja feliz e nem que eu não tenha dificuldades, porque
tenho sim com o meu trabalho, com ser mulher e com outras coisas.
Pretende se casar novamente e ter filhos?
Acho que não.
Você já é avó? Como lidar com as futuras dúvidas do
seu neto?
Sou ele me chama no masculino mesmo. Mas
ele não vai precisar ter dúvidas porque ele vai crescer cm algo que já faz
parte do mundo dele . As dúvidas surgem se você mostrar elas.
Qual a maior dificuldade na hora de uma mulher
trans arrumar um emprego? O que falta para as empresas se conscientizarem?
Não é só pela empresa, é também uma
dificuldade da própria pessoa que sabe que vai encontrar problemas e ao mesmo
tempo ela tem outra possibilidade que é a prostituição, que é um mercado
informal onde muitas vezes se ganha mais.
Você é bem ativista nas rede sociais em relação a
outros países que não aceitam a homossexualidade
Ter virado uma ativista depois que me
assumi foi uma consequência que não esperava, na verdade eu sempre fui ativista
de alguma coisa. Eu era comunista no passado e meu trabalho como cartunista
também me possibilitou nessa parte. De alguma forma, eu sempre tive meu braço
partidário. A questão da Rússia, por exemplo, interessa o Brasil porque o Putin
tem ideias semelhantes da direita do nosso país, de que ser gay é coisa
que você tem que fazer escondido dos outros e pode ser um mau exemplo para as
crianças.
Você já fez três coberturas de copas do mundo (78,
82,86), o Brasil está preparado para receber um evento desse quanto problema de
infraestrutura?
Eu não entendo muito disso, a principio
eu acho que não deveria fazer nada, já tem estádios no Brasil.
O banheiro deveria ser unissex?
Deveria ter banheiro unissex em todos os
lugares
As novas tecnologias atrapalham, ajudam ou
complementam o trabalho do cartunista?
Ajudam a construir. Me possibilitaram o
mundo da cor, eu tinha dificuldade de lidar com lápis e tinta. O Photoshop
abriu uma quantidade de possibilidades muito boa.
A população tem o acesso que deveria aos
cartoons? Elas entendem a mensagem?
Isso de não entender tem em
qualquer linguagem. Quando falamos de cartunista não estamos falando de um tipo
de produção só, mas de diversas formas de fazer cartoons. Dentro desse
universo, até mesmo na Folha, existem jeitos diferentes têm leitores que não
entendem mesmo. Os cartunistas que recebem mais cartas de leitores que
não compreendem os quadrinhos são eu e o Angeli (risos). Ás vezes eu
respondo, porque eu acho que eles merecem uma resposta.
O que você acha do grupo Procure Saber? Você acha
que eles têm um pouco de razão?
Não acho, eu discordo da tese de
controle. A não ser a parte de dados particulares que você abre ou não abre,
mas a parte da sua vida que é pública ok, não precisa de autorização. Eu
confesso que não estou muito á par de como esse assunto caminhou.
Você acha que o Brasil deveria legalizar a maconha?
Por quê?
Eu acho que não deve ser considerado
crime, deve ser igual ao cigarro e álcool. Essas substâncias devem
estar de alguma forma assumidas claramente pela sociedade.
Em 2012 você teve sua residência invadida e sua
coleção furtada, o que falta para a nossa segurança melhorar?
Essa discussão de como controlar isso tem
haver também com a polícia e as diversas formas de controle social, não adianta
só resumir a coisa no pensamento fascistoíde de colocar a Rota na rua e
atirar. Todas as questões tem que ser analisadas conjuntamente, não
adianta focar em uma coisa só, como reduzir a maioridade penal para diminuir a
criminalidade, não vai acontecer. Vai aumentar a presença de gente com poucos
crimes irrisórios dentro de um sistema prisional que está lotado. Acho
que tem que ter uma forma racional para lidar e discutir esses problemas.
Redução da maioridade penal, contra ou a favor?
Totalmente contra. A redução de
maioridade penal é uma forma da sociedade se desfazer dos problemas dos
menores, é mais uma forma da sociedade virar as costas para
direitos civis. A população de jovens e crianças têm direitos e eles
jamais foram assegurados. Esse é mais uma questão que está sendo jogada de lado.
Você está gostando da gestão do Haddad? O que falta
melhorar?
Eu gosto do governo dele de modo geral. O
que ele fez na cracolândia eu achei correto, esse tipo de conduta da Operação
Braços Abertos, eu aprovo.
Você está gostando da gestão do Geraldo? Sistema
Cantareira?
Eu acho meio desastroso a gestão
dele. Os dados que tenho acesso sobre a gestão me fizeram pensar assim. A
gestão do PSDB precisa sair de campo. O Trágico da crise no sistema
Cantareira é que trata de resultados de processos antigos, é um resultado de um
descaso que vem de antes, assim como o metrô. É ridículo São Paulo ter essa
quantidade de km de metrô para a população que temos.
Semana passada o IPEA divulgou um estudo feito com
a população e o resultado mostrou um machismo grande da nossa sociedade em
vários sentidos. A maioria dos entrevistados eram do sexo feminino, por que
existem mulheres tão machistas?
Esses dados que percorrem a sociedade e
que a gente acaba caracterizando como machismo, eles são espalhados mesmos,
eles não são de homens machos nascidos com genitália masculina, eles são disseminados e
partilhados também por mulheres. Diferente do que conhecemos por feminismo, que
é um movimento consciente com mobilização. É meio chocante ver isso porque
machismo é um item cultural, é um dado de opressão, não só para as mulheres
como a comunidade GLBT, o machismo é um sinal de atraso cultural muito grande.
Agora essa pesquisa foi mal divulgada eu acho.É uma frase que foi posta
com respostas a partir do nível de concordância, a leitura desse tipo de
pesquisa precisa passar por um filtro antes de ser divulgada porque não é
verdade essa constatação, pode ser até pior (risos). Mesmo que seja uma
pesquisa feita em 2013, é errado divulgar ela assim como foi feita, esse tipo
de formulário de pesquisa existe, corresponde a um linhas de abordagem
sociológica, mas não da para fazer a transferência direta da informação, por
exemplo, uma das perguntas era assim: briga de marido e mulher não se mete a
colher, mas de que tipos de briga estão falando? Não é uma coisa muito simples
de se ir passando. Eu acho que o Brasil é um país onde o machismo tem grande
expressão e que envolve também mulheres, porque é uma expressão do
conservadorismo dentro da vivência dos gêneros. A questão é verificar a existência
dele.
Apesar das mudança, nessa mesma pesquisa foi
revelado que 48% dos entrevistados não gostam de ver beijo gay. O brasileiro
continua homofóbico?
Apesar de algumas evoluções, o brasileiro
continua homofóbico sim. Pesquisas como estas revelam algumas coisas
pontuais e a divulgação dela acontece de maneira deformada, mas saber ao certo
quanto evoluiu e o quanto estamos atrasados nesse conceito não tem como saber.
No fundo nós vamos nos guiando pela nossa intuição, pelas redes sociais
(Facebook) e amigos que falam sobre esses ataques que acontecem.
Estamos na semana dos 50 anos do golpe de 64 e tem
pessoas que ainda querem uma intervenção militar. Você que viveu um pouco essa
época, o que diria a essas pessoas?
Eu era adolescente nessa época e as
pessoas que querem essa intervenção não viveram esse período. Essa é a
expressão do fascismo brasileiro. A direita brasileira se expressa desse jeito,
eles não estão se referindo ao movimento da ditadura especificamente, eles
querem é derrubar a Dilma e o PT. Chamar os militares é uma bravata, nem
militar quer fazer isso mais e se isso acontecer os militares vão fingir que
não estão. Eles aproveitaram o aniversário de 50 anos para expressar um ponto
de vista de direita, que é uma forma publicitária também . Agora essa
discussão tem reflexo no que a sociedade está falando e que é necessário sobre
segurança e policiamento, a desnaturalização da polícia.
O que te vem na cabeça:
Jair Bolsonaro?
Eu não quero falar. Eu acho que o
diálogos entre as forças políticas que estão se expressando tem que existir,
não tem nada contra o debate de ideias. Não tem o que se conversar com ele.
Tinha o que se conversar com o Feliciano, pela posição que ele estava ocupando
e era preciso estabelecer diálogo com ele.Vários momentos houve essa conversa,
mas sem muito resultado, diferente do que aconteceu com o Jair.
Dilma e a crise da Petrobras?
Eu gosto do governo dela. Eu acho que
essa crise está um pouco explorada demais pela imprensa, um pouco mal contada
essa história.
Marco Feliciano?
Ele é meio movido a escândalos. A
carreira política dele não é absolutamente nada expressiva e como ele não
tem o menor significado do ponto de vista de construção ideológica de qualquer
coisa útil, ele procura se construir nesse escândalo. Que é uma área de tensão
muito grande na sociedade brasileira hoje, as questões morais e a religiosidade
do povo. Não só ele como outros autodenominados representantes de deus
procuram lucrar tanto em termos de grana como em termos poder, presença de
mídia, avanços na área de votos e tudo isso quer dizer poder de negociação. É
uma área que não propõe nada do ponto de vista político, de organização sócio-
econômica. O embate deles têm se dado na área moral, não quer dizer que eles
não fazem nada na área sócio- econômica, eles fazem acertos e acordos mais
espúrios que se imagina, mas o ponto programático deles é zero.
Jean Wyllys?
Estou bem representado, ele é uma grande
pessoa e um bom parlamentar.
Comissão da Verdade?
Fazendo seu trabalho, lamento que seja um
pouco limitada, mas dentro dessas limitações a comissão está sendo eficiente.
Comissão de Direitos Humanos e Minorias?
Agora voltou para o convívio da
civilização, podemos voltar a usá-la (risos).
Glauco?
Um amigo fantástico e uma pessoa
fantástica também, criou momentos de cartoons e histórias bem luminosos. Eu
sinto ele de vez em quando, lembro muito dele.
TV Colosso?
Um trabalho que gostei muito de fazer e
acho que poderia ter ficado melhor do ficou. O projeto inicial era para ser
dentro de produção de séries, consagrados pelos americanos, e não foi feito
assim. O primeiro programa foi ao ar duas horas depois de acabar de ser
feito e trabalhar nesse esquema era bem desgastante para todos.
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